Nas últimas décadas várias indústrias mudaram completamente. Táxis, entrega de alimentos, hotelaria, moda e mesmo reparações domésticas. No entanto, apesar de todas estas enormes mudanças, a manutenção tem permanecido na mesma. Tem aparecido tecnologias disruptivas, é certo, mas a economia de partilha e a gig economy não fizeram qualquer mossa nos serviços técnicos. Estará isso agora prestes a mudar? O que é a “uberização dos técnicos e dos serviços no terreno”? Esse é o nosso tema de hoje.

Porque é que os serviços “uberizados” têm vantagem?

Embora estejamos todos familiarizados com a Uber® e outras aplicações semelhantes, talvez nunca tenha dedicado um minuto a pensar no que as tornou tão bem sucedidas. Em muitas cidades europeias, os Ubers são mais baratos que os táxis. Aliás, os taxistas queixam-se frequentemente de “concorrência desleal” por parte das aplicações de ride-sharing. Os mercados não regulamentados permitiram-lhes operar com menos despesas e, assim, oferecer preços mais baratos.

Contudo, tal não acontece em todos os mercados. Talvez fique surpreendido por saber que os táxis são normalmente mais baratos que os Ubers em Nova Iorque. E em alguns países onde os motoristas precisam de ter licenças, como a Itália, o ride-sharing é normalmente mais caro que os táxis. Portanto, a questão do preço não explica totalmente a sua popularidade. O que o explica, no entanto, é a conveniência.

Vivemos num mundo em ritmo acelerado, onde tudo deve estar imediatamente disponível. Para os clientes, é uma era de gratificação instantânea – e os serviços “uberizados” satisfazem essa procura. A “uberificação”, como se pode chamar, é o processo através do qual as empresas ligam os clientes aos serviços, proporcionando-lhes uma melhor experiência.  Ao mesmo tempo, oferece aos profissionais uma infraestrutura digital que não possuíam.

Porque é que ainda não houve uma uberificação dos serviços no terreno?

Os condutores que oferecem serviços de transporte precisam de provar que possuem uma carta de condução válida e, em alguns casos, que os carros cumprem determinados critérios. No entanto, estes não são obstáculos exigentes ao acesso. Por outro lado, a uberização dos serviços no terreno exigirá um processo de verificação mais minucioso. Os aspirantes a técnicos precisam de assegurar às pessoas que têm:

  • as competências certas; 
  • as ferramentas apropriadas; 
  • experiência suficiente na área;
  • familiaridade com cada tipo de equipamento. 

Em Manutenção e Facility Management, o fator-chave para o sucesso é a capacidade de fornecer serviços de alta qualidade de forma consistente. Portanto, qualquer empresa de serviços que utilize terceiros, ou qualquer software que ligue utilizadores a técnicos de serviços no terreno, precisa de verificar todos os critérios acima. Além disso, precisa de fornecer prova de serviço (por exemplo, prova de limpeza) para ganhar confiança.

No entanto, também podemos prever que esses obstáculos à admissão desaparecerão com a introdução de mais tecnologia. Não é difícil imaginar soluções que possam ajudar os freelancers e oferecer mais garantias aos clientes:

  • As empresas podem criar uma base de dados de procedimentos operacionais padrão para ajudar os técnicos no terreno (ou um terceiro pode aprová-los na app, mediante o pagamento de uma taxa);
  • Técnicos e gestores seniores podem fornecer assistência remota utilizando redes 5G sem latência;  
  • As empresas e fabricantes podem utilizar a Inteligência Artificial para uma maior precisão no diagnóstico (provavelmente mediante pagamento);
  • Alguns serviços podem ser executados com a assistência de cobots ou mesmo por robots operados por técnicos, aumentando a segurança.  

As restantes funcionalidades necessárias para a manutenção ‘uberizada’ já existem. As mais avançadas Plataformas Inteligentes de Gestão de Manutenção (IMMP) existentes permitem cada vez mais a uberização:

  • Os clientes podem facilmente comunicar falhas numa aplicação móvel, sem ter de recorrer a um call centre
  • A plataforma atribui automaticamente a ordem de trabalho a um técnico utilizando inteligência artificial (também possível com o Infraspeak Gear™); 
  • O cliente pode ver a localização do técnico e o tempo estimado para chegar
  • O cliente pode ver a identificação do técnico e as suas certificações, para aumentar a transparência (também exequível, como explicado acima); 
  • Os gestores podem verificar tudo em tempo real e fornecer apoio, se necessário.

“Cada vez mais, vamos assistir a uma ‘uberização do técnico’. As empresas de FM vão precisar de aplicar deep learning, machine learning, essas coisas todas. Caso contrário, como pode uma empresa de FM gerir milhares de ordens de trabalho por ano?”

Miguel Iacomussi

Gerente de Transformação Digital e Inovação na Vivante, um dos maiores fornecedores de Facility Management do Brasil

Finalmente, temos de ter em consideração que existe uma mão de obra altamente qualificada que pode estar desejosa de avançar por conta própria. Trabalhar por conta própria, ou pelo menos poder escolher as tarefas que desejam através de uma aplicação, vai proporcionar mais flexibilidade aos técnicos que gostariam de escolher o seu horário ou que estão a esforçar-se para encontrar um bom equilíbrio com a vida familiar.

Extra: Os fabricantes podem viabilizar ou inviabilizar a uberização

Vale a pena salientar que os fabricantes não estão necessariamente excluídos deste modelo de negócio. Vamos ver como poderia funcionar:

Os fabricantes fornecem procedimentos operacionais padrão a técnicos e engenheiros certificados

Os fabricantes podem ser obrigados a fornecer informações técnicas e planos de manutenção a técnicos certificados. Isto é semelhante ao que aconteceu com a manutenção de automóveis, por exemplo. Antes, era necessário reparar o automóvel num concessionário oficial para manter a garantia do fabricante. 

Mas, ao abrigo da legislação de Isenção por Categoria da União Europeia – que ainda se mantém em vigor no Reino Unido – pode recorrer a um mecânico independente sem perder a garantia do automóvel, desde que as diretrizes do fabricante sejam seguidas e que o livro de manutenção seja carimbado.

Os fabricantes assumem a dianteira com os seus próprios serviços ‘uberizados’

Numa outra visão, os fabricantes poderiam desenvolver a sua própria tecnologia. Os clientes teriam então acesso a uma aplicação onde poderiam reportar uma avaria e procurar técnicos certificados e formados pelo fabricante. Isto iria provavelmente ajudá-los a encontrar uma solução mais rapidamente, para além de aumentar a notoriedade e a satisfação da marca.

No que lhes diz respeito, os fabricantes poderiam aproveitar esta tecnologia para fornecer “manutenção como serviço” sem investir numa enorme infraestrutura de apoio ao cliente (a comunicação é, na maior parte das vezes, através da aplicação móvel, diminuindo a necessidade de call centres, por exemplo) ou na contratação de dezenas de técnicos sem testar a procura.

Durante muito tempo, a uberização dos serviços no terreno pareceu um esforço árduo. Atualmente, a tecnologia está a remodelar a Manutenção e Facility Management, aproximando-as dos serviços uberizados. Os prestadores de serviços que queiram resistir a estas mudanças futuras terão de se concentrar na prestação de serviços bons, rápidos e fiáveis e em proporcionar uma experiência ao cliente que ofereça gratificação instantânea – com a ajuda de tecnologia inteligente, claro.

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