Quem trabalha em manutenção e facility management sabe que as mulheres estão em minoria na manutenção. Mas, por quê? Por que a manutenção continua sendo predominantemente masculina? E como podemos inverter essa situação?

 

Começamos investigando porque há tão poucas mulheres em manutenção. Depois dessa “análise de causa raiz”, chegamos a 8 estratégias que você pode aplicar para contratar mais mulheres, reter talentos femininos na sua empresa e igualar a balança.

 

Por que existem tão poucas mulheres em manutenção e facility management?

 

“Elas não querem”

Se o seu primeiro instinto é dizer que hoje em dia não há mulheres trabalhando em manutenção porque “elas não querem”… Tente outra vez. Por um lado, não podemos ignorar que as mulheres não são encorajadas a seguir este tipo de carreiras. Mas, por outro, os números revelam outra realidade:

 

61% das engenheiras já foram discriminadas no trabalho

52% sentem que têm menos reconhecimento do que os colegas homens

 

Entre as estudantes:

72% têm medo que a maternidade seja um obstáculo

68% antecipam comentários sexistas no trabalho

56% estão convencidas que vão sofrer discriminação no trabalho 

49% acreditam que vão ter menos reconhecimento do que os colegas homens

 

Diante deste panorama, a falta de candidatas ainda te estranha? 

 

Enquanto as mulheres sentirem um ambiente hostil nos setores da indústria, inovação e tecnologia, será impossível formar equipes mais equilibradas. Se a sua empresa sofre com a falta de candidatas, no fim do artigo compartilhamos várias táticas para recrutar talentos femininos e ir desconstruindo alguns dos receios das jovens que estão prestes a entrar para o mercado de trabalho.

 

“A manutenção é trabalho para homens”

Será que a manutenção é mesmo esencialmente sexista? Para entender o fato de ser um setor predominantemente masculino, precisamos voltar aos primórdios da manutenção. Inicialmente, a manutenção consistia sobretudo em manutenção corretiva. Em outras palavras: reparações que exigiam imensa força física e para as quais os homens estavam, inicialmente, mais aptos.

 

Sabemos que hoje em dia a manutenção corretiva é uma pequena parte do trabalho. Estamos evoluindo para uma manutenção cada vez mais planejada, até preditiva, em que o argumento da força física não é válido. Pelo contrário, o foco maior está na necessidade de dominar questões técnicas. Portanto, não há motivos para perpetuar o ciclo e continuar a excluir as mulheres da manutenção. 

 

Inclusive, é interessante olhar para um estudo publicado no Brasil em 2016:

 

  • Apenas 20% das empresas tinham mulheres no departamento de manutenção. (Nos Estados Unidos, só 5% dos técnicos de manutenção industrial são mulheres.)
  • Entre os motivos para não contratar mulheres, segundo os gestores, estão a “falta de procura” e a força física
  • 17% diziam que “não contrariam mulheres” porque “não teriam onde colocá-las” e “não podem contratar alguém com limitações físicas

 

Segundo os gestores:

  • A maioria contrataria para funções de organização/ planejamento e liderança/ gestão, uma vez que associam as mulheres a características como mais atenção ao detalhe, capacidade de organização e cuidado.
  • Entre os que não empregavam mulheres, havia a perceção de “não haver preconceito” e de ser “uma atividade para homens” (em igual porcentagem). Outros gestores consideraram que se deve a uma “questão cultural”, “problemas de relacionamento [com o público masculino]” e à sua “fragilidade física”.

 

Segundo os operadores:

  • Em vez de mencionar “características femininas”, a maioria dos operadores considera que o importante é serem qualificadas. Consideram que as mulheres podem ser contratadas em todas as áreas, mesmo nas mais técnicas.
  • A maioria reconhece que existe o preconceito de ser uma “atividade para homens” e, muito mais do que os gestores, reconhecem que há uma cultura de machismo e preconceito. 

 

Portanto, parece haver mais resistência por parte de quem recruta do que por parte das equipes. De resto, as equipes mistas têm um desempenho melhor, segundo um estudo da Universidade de Copenhague. Com isto em mente, também apontamos algumas estratégias para mudar os processos de recrutamento. 

 

“As mulheres abandonam a carreira”

Já percebemos que a falta das mulheres na manutenção se deve tanto à falta de candidatas como a preconceitos no processo de recrutamento. Mas depois de entrarem para as empresas, porque há tão poucas mulheres em cargos de liderança? Na Europa, as mulheres só representam 37% dos cargos de gestão, 28% dos membros de direção e 18% dos administradores sêniores. Será que elas deixam mesmo de trabalhar?

 

Voltamos às estatísticas, desta vez mais focadas no que sentem as mulheres que já entraram para o mercado de trabalho e não das potenciais candidatas. Usamos estatísticas para mulheres que trabalham em engenharia (e muitas vezes poderiam ocupar os cargos de planejamento e organização, que não exigem força física). Não encontramos nenhum estudo sobre técnicas de manutenção.

 

  • No Reino Unido, 63% das engenheiras experienciaram comentários ou comportamentos inaceitáveis (três vezes mais do que as mulheres que trabalham no setor financeiro ou na saúde).
  • 60% acreditam que os homens crescem mais rápido na carreira e só 35% sentem que foram tratadas de forma igual.

 

Abandonar ou não a carreira:

  • Outro estudo no Reino Unido, que se focou no início da vida profissional e nos motivos para trocar de setor, descobriu que 64% das engenheiras se sentem subvalorizadas (em comparação comos colegas homens) no começo da carreira. Cerca de 54% sentiu que não era tratada de forma igual aos seus colegas homens, uma percentagem muito mais alta do que no setor financeiro (40%) e na saúde (34%). 
  • Estes fatores fazem com que as mulheres ponderem abandonar a profissão, um fenômeno que também é visto nos EUA e no Canadá.
  • Segundo a Harvard Business Review, 40% das engenheiras se despedem  ou nunca chegam a entrar na profissão. Há várias que reportam experiências negativas logo no estágio (assédio, não se sentem “levadas a sério”, machismo).

 

E o ciclo se perpetua:

  • Mesmo no início da carreira, 51% das mulheres sentem que tem poucas oportunidades para progredir.
  • Há poucas mulheres em cargos de liderança e muitas engenheiras se veem como uma exceção, o que faz com que as novas candidatas não tenham “modelos”. Já que são tão poucas, também não existe um coletivo que procure mudar as práticas e comportamentos da indústria.
  • Muitas mulheres engenheiras “se masculinizam” como um método de defesa e sobrevivência no local de trabalho. É possível que as candidatas sintam que têm que adotar determinadas características e comportamentos “masculinos” para crescer na carreira.

 

Diante deste cenário, fica claro que as empresas não podem focar apenas em contratar mulheres. Também precisam reter esses talentos e dar oportunidades para que possam crescer.

 

Lições da pandemia de COVID-19: a mudança começa em casa

Apesar das enormes mudanças nos últimos anos, as mulheres continuam fazendo muito mais trabalho doméstico não remunerado. Mesmo nos países desenvolvidos, as mulheres passam duas vezes mais tempo do que os homens exercendo a função de cuidadoras (de crianças e idosos) ou nas funções domésticas. 

Durante a pandemia, 60% das mulheres fizeram a maior parte da limpeza em casa, 63% tinham sido responsáveis pelas tarefas escolares dos filhos, 54% teve que adaptar o seu horário e 47% sentiu que estas alterações prejudicaram a sua progressão na carreira

Outro estudo descobriu que as mulheres, que também são mais afetadas pela precariedade e pelo trabalho informal, têm mais 24% de probabilidade de ter perdido o emprego durante a pandemia de COVID-19 do que os homens.

 

Como inverter a situação?

 

Não há respostas simples para erradicar a desigualdade de gênero. Mas podemos começar “em casa”, ou seja, nas nossas empresas. O primeiro passo é colocar a mão na consciência: por que há tão poucas mulheres em manutenção? Por que temos poucas candidatas, se as mulheres hoje têm tanta formação acadêmica como os homens? 

 

A partir do momento em que reconhecemos que é uma questão cultural, e em que entendemos que talvez a cultura da nossa empresa não seja assim convidativa para futuras candidatas, podemos começar a desconstruir esses preconceitos e a fazer um esforço coletivo para abandonar os estereótipos e transformar a Manutenção e o Facility Management em uma indústria mais igualitária.

 

Deixamos aqui algumas técnicas que você pode adotar para contratar mulheres em Manutenção e reter talentos na sua empresa:

 

Utilize linguagem neutra

Evitar dizer, por exemplo, “procura-se técnico” e prefera algo como “procura-se técnico/a” Evitar imagens estereotipadas, até porque a manutenção já não consiste apenas em trabalho físico. Procure utilizar linguagem que não faça com que as candidatas se sintam excluídas já no primeiro contato.

 

Estabeleça critérios de seleção objetivos e transparentes

Tanto para novas contratações, como em concursos internos para progressão na carreira, faça um esforço para ter um processo de seleção objetivo. Isto não só promove a igualdade de gênero, como é uma das principais técnicas para conseguir reter talentos femininos na sua empresa.

 

Faça avaliações periódicas de desempenho

Avaliações feitas de modo objetivo evitam que as mulheres se sintam subvalorizadas e são uma oportunidade para lhes dar feedback. Eventualmente, estas avaliações também podem ser um critério para chegar a cargos de topo.  

 

Monitore o progresso de recrutamento

Nas empresas extremamente desiguais, é importante acompanhar o progresso de recrutamento. Entenda se as candidaturas de mulheres estão aumentando, os motivos pelos quais são rejeitadas e a taxa de retenção na empresa. Só assim você pode garantir que os Recursos Humanos não estão enviesados e que há um esforço para contratar mulheres ou, no mínimo, não rejeitá-las pelo seu gênero.

 

Proporcione formação específica para funções em que as mulheres estão em minoria

A nível global, há 40 – 160 milhões de mulheres que precisam de upskilling, especialmente nas áreas com mais potencial para a automação. Se forem bem sucedidas, teremos empresas mais equilibradas. Caso contrário, a diferença salarial irá aumentar.

 

Procure novos talentos em canais alternativos

Em vez de publicar anúncios nas redes sociais ou em plataformas com anúncios de emprego, procure talento em universidades, escolas profissionais ou até em grupos de Women in Tech. Se a empresa apresentar uma proposta às candidatas, já dissipa as dúvidas sobre a sua cultura.

 

Comece logo pelos estágios

A maior parte das mulheres só descobre o seu interesse pela manutenção durante os estudos ou durante o primeiro emprego. Por isso, se estiver disposto a colaborar com escolas ou universidades, acabará recebendo candidatas com muito talento e que contratar e reter na sua empresa. 

 

Faça um compromisso explícito e público para contratar mais mulheres

Algumas empresas definem metas ou cotas – que tornam públicas – para contratar mais mulheres ou outras minorias. A Bayer, farmacêutica alemã, comprometeu-se a ter 50% de mulheres em cargos de chefia até 2030. A liderança feminina é um dos maiores motores para reter mulheres na sua equipe.

 

Aqui na Infraspeak, quase sempre encontramos estatísticas muito desiguais para os diferentes países e mercados. No entanto, como vimos, a falta de mulheres na manutenção é um problema que se repete em todos os países desenvolvidos. Está nas nossas mãos inverter a situação e tornar as empresas mais justas para as candidatas. Aproveitemos o futuro digital que nos espera para esbater as diferenças que herdamos dos primórdios da manutenção.