É inegável que a indústria hoteleira foi a mais afetada pela pandemia de COVID-19. Entre abril e maio, os aviões ficaram em terra, os hotéis fecharam e os restaurantes trabalharam como cozinhas fantasma a sobreviver à custa do take-away. E, precisamente quando as coisas começavam a retomar, chegou uma segunda vaga e o confinamento 2.0.
A dura realidade é que o COVID-19 vai continuar a afetar o funcionamento da indústria hoteleira no próximo ano. Mas quais vão ser as principais tendências e desafios da hotelaria em 2021, ainda sob a nuvem escura da pandemia?
Um caminho longo e sinuoso até à recuperação plena
Porque haveríamos de lhe mentir? Vai demorar muito tempo até voltarmos a ter as taxas de ocupação e os lucros da era pré-COVID. Como subestimámos o tempo necessário para desenvolver uma vacina ou um tratamento, o setor vai enfrentar os piores cenários que previmos em março. Além do receio em relação às viagens, a crise económica também vai ter um grande impacto. É possível que só superemos os níveis de 2019 em 2024.
A Deloitte Canada fez um estudo cujas conclusões talvez se apliquem a todos os mercados. Perante esta crise, a maioria dos consumidores planeia reduzir os gastos com hotelaria e restauração, em troca de aumentar as despesas de supermercado e em serviços digitais. Mas, para termos uma ideia de como o futuro poderá ser, devemos olhar para o passado. Depois dos ataques do 11 de setembro, do surto de SARS em 2003 e do tsunami no Oceano Índico em 2004, a perceção de insegurança também se misturou com a queda dos mercados.
Em todos esses casos, a hotelaria viu-se forçada a procurar novos segmentos e a explorar o mercado doméstico, a oferecer pacotes promocionais, e a virar o marketing para uma mensagem focada na segurança até restabelecer a confiança dos hóspedes. Ainda assim, é preciso ter em consideração que o COVID-19 tem uma distribuição geográfica muito superior, e é uma crise que a ciência pode resolver.
Os hotéis mais económicos devem recuperar mais depressa
Nem todo o setor vai recuperar ao mesmo ritmo. É provável que os hotéis mais económicos recuperem mais depressa, dado que há mais procura, menos necessidade de manutenção, e menos gastos com mão-de-obra. Mesmo com uma taxa de ocupação mais baixa – quer seja para descontaminar quartos ou por falta de hóspedes – muitos destes hotéis mantêm-se rentáveis. Os hotéis de luxo e os resorts precisam de ter uma taxa de ocupação 1.5 vezes mais alta para se manterem à tona.
Para estes hotéis, a equação tem três variáveis: rendimentos variáveis (dependem da ocupação do hotel), despesas semifixas (serviços que pode suspender, como o bar da piscina ou o spa) e despesas fixas (estes serviços não podem ser suspensos, como a segurança ou AVAC). A única forma de reduzir os custos é jogar com as despesas semifixas, mas o reverso da medalha é comprometer a experiência do cliente. Arriscamos a dizer que encontrar um equilíbrio é o maior desafio para os hotéis que se encaixam nesta categoria.
- Está a pensar cortar na manutenção do seu hotel? No início da pandemia preparamos uma checklist com tarefas de manutenção essenciais para hotéis encerrados. Essas são as suas despesas fixas de manutenção, que deve manter mesmo que não tenha todo o hotel em funcionamento.
Os consumidores vão preferir destinos mais próximos
Esta é uma tendência que já vimos em 2020, e deverá continuar devido ao medo coletivo de novas restrições e confinamentos. Enquanto a Europa ainda estava a lidar com a primeira vaga, a China estava a reabrir as suas cidades. As províncias perto do mar, que costumavam ser as mais populares mas que dependem de voos de longa duração, demoraram mais a recuperar. Por outro lado, para as províncias mais próximas, acessíveis por autoestrada ou comboio de alta velocidade, o número de viajantes aumentou imenso face a anos anteriores.
Na Europa, esta tendência verificou-se outra vez durante o verão – as pessoas preferiram os mercados regionais, que talvez sejam mais rurais e sustentáveis, às grandes cidades. Por toda a Europa, as taxas de ocupação nos mercados regionais variaram entre os 40 e os 60%, enquanto as cidades nunca ultrapassaram os 20-30%. Em Portugal, os mercados regionais tiveram taxas de ocupação de 52%; as cidades ficaram-se pelos 16%. Esta tendência não se vai alterar se os consumidores sentirem mais segurança e confiança perto de casa.
Recuperar o voto de confiança dos hóspedes
Um estudo feito em Espanha explica que há dois grandes fatores que influenciam a decisão dos hóspedes. Um é a confiança no país ou região de destino – o que explica a tendência das staycation – e o outro é a confiança no hotel em si. Portanto, recuperar a confiança dos hóspedes é definitivamente um desafio para 2021. Muitos hotéis, nomeadamente algumas cadeias bem conhecidas, têm recorrido a programas “stay safe” que incluem cuidados médicos, medições de temperatura, desinfetante de mãos gratuito e produtos de higiene.
O mesmo estudo da McKinsey mostrou que os hóspedes valorizam cuidados redobrados com a limpeza, incluindo a esterilização com raios UV, tempos de intervalo entre estadias, e talvez até testes rápidos durante o check-in, em conjunto com todas as medidas dos programas “stay safe”. Por outras palavras: os consumidores querem que os hotéis não poupem esforços para mitigar o contágio de COVID-19, e esperam que o demonstrem. A solução pode passar por certificados de segurança ou apps como a Clean & Safe, que a Infraspeak desenvolveu em conjunto com o Turismo de Portugal. Muitos outros países têm apps semelhantes.
- Ainda não é suficiente? Veja algumas das nossas ideias para recuperar a confiança dos seus hóspedes.
Os viajantes mais tecnológicos da era pós-COVID
Segundo a Deloitte, este também é um fenómeno que vamos ver no futuro. Durante o confinamento, a maioria das pessoas recorreu à tecnologia para comunicar com a família e amigos, entretenimento ou até para encomendar produtos essenciais. Quando voltarmos a viajar, é natural que muitos consumidores se mostrem mais recetivos às novas tecnologias e estejam mais confortáveis a usá-las.
Isto significa, por exemplo, que os check-ins e check-outs autónomos podem tornar-se a norma num futuro próximo. Mas há uma série de opções a explorar, como apps para serviço de quartos, controle remoto do ar condicionado ou pedir a limpeza do quarto, na onda do que os smart hotels têm vindo a fazer. Por um lado, é um desafio oferecer uma experiência de cliente que combina o contacto humano com estas interações. Por outro, é uma oportunidade de melhorar as operações e minimizar contactos cara a cara até que a pandemia esteja controlada.
Por último, há algo de que não nos podemos esquecer: os seus clientes procuram uma experiência única. Mesmo que estejam com máscara, ou separados por um vidro, a indústria hoteleira tem de lhes proporcionar experiências memoráveis – embora com cuidados extras de segurança.