Bom dia, Postiga! És Senior Backend Developer na Infraspeak e membro de algumas comunidades. Conta-nos um pouco mais sobre ti.
Sou curioso, principalmente. Daí estar também na área profissional que estou. Adoro resolver problemas e quebra cabeças. Gosto de jogar xadrez, como já foi demonstrada nos retiros (!) e, basicamente, acho que sou uma pessoa relaxada e divertida.
Quando era mais novo, o que eu gostava mesmo era de montar e desmontar computadores porque desde os meus 6 anos tive contacto com eles. Um amigo meu da escola, na altura, tinha um computador em casa que foi instalado pelo pai e nós costumávamos ir para lá brincar um bocado com aquilo. Na altura, ‘computador’ era uma palavra nova para mim mas como não tínhamos mais nada para fazer, lá ia eu descobrir coisas novas.
Para mim, aquilo era fascinante. Carregar naqueles botões duros e chassis frios, brancos e feios. A partir do momento em que aquilo começou a funcionar, deu um clique para mim. Eram poucas luzinhas, mas piscavam e para uma criança isso era suficiente para começar a cativar o interesse. Para além disso, a interactividade com uma caixa, que era a minha única definição para computador na altura, era muito divertida.
Comecei a trabalhar com o Windows 95 e não fazia mais nada para além de abrir pastas, fechar pastas. criar documentos vazios, apagar documentos vazios. Adorei. A partir daí quis trabalhar com aquilo. Rapidamente descobri que uma tia minha também tinha um computador e foi aí que comecei a descobrir mais e mais. Esse PC tinha um sistema operativo ainda mais antigo, que me obrigava a usar a linha de comandos. Como gostava de jogar jogos, fui aprendendo os comandos e as pastas onde eles estavam.
Fast forward cerca de 14 anos, comecei a trabalhar com a programação em si e isso foi um unlock de um novo objectivo. Disse para mim mesmo que “até agora trabalhei com estas ‘maquinetas’ da forma que eles me pediam mas, se começar a aprender programação, posso ganhar controlo e fazer aquilo que eu quero”.
Larguei os meus planos originais e estou neste momento na Infraspeak!
Começaste a programar logo aos 15 anos por interesse e curiosidade. Como é que isso aconteceu? Quando é que soubeste que era exactamente isso que querias seguir profissionalmente?
Há uma coisa muito interessante sobre mim – se existir alguma coisa que cativa o meu interesse, eu vou saber todos os ins and outs dela. Assim que entrei no secundário, optei pela opção mais hands on possível e o único curso que correspondia aos meus objectivos era um curso tecnológico de informática. Foi perfeito porque assim não tinha que perder vários anos a estudar coisas que não me interessavam tanto, como humanidades, por exemplo.
O objetivo do curso era basicamente ser um ano zero para a universidade, que fizesse com que os alunos tivessem alguma experiência dentro da área que gostassem. Logo nas primeiras disciplinas que temos a nível de informática, é aprendi a programar com Pascal, uma linguagem horrorosa comparada com a que eu trabalho actualmente, bastante low level e inflexível. Fazer algo com ela não é impossível, mas roça a odisseia! Foi o suficiente para começar.
Depois, não me fiquei por onde as professoras deixavam. Corri o livro de trás para a frente e fui avançando nos tópicos. Desde então, sempre que quero aprender algo, leio toda a informação disponível, faço perguntas, e vou explorando. Quando dei por mim, no último ano do secundário, já estava a trabalhar com as tecnologias que trabalho hoje. Desenvolvimento web, PHP, bases de dados remotas e MySQL, enquanto que na escola estávamos ainda a começar a desenvolver o C, comandos de terminal, nada de muito excitante.
Na altura, também já se falava, em algumas comunidades, em informação descentralizada e em não haver distribuição de executáveis ou instaladores. O que mais me cativou aí foi a possibilidade de desenvolver e colocar o programa num ‘sítio mágico’ que eu não sabia bem onde era, até porque na altura ainda nem se falava em cloud e desde que a máquina o interpretasse, o código corria. Muitas das dores que eu tinha até ao momento acabaram e eu virei-me para a web, que é o que faço ainda hoje.
És uma pessoa normalmente activa nas plataformas que frequentas, desde Twitter a Twitch passando por alguns projectos em que participas. De onde veio essa vontade de expandir aquilo que fazes na direção da comunidade?
Sempre foi minha intenção estar rodeado e investido nas comunidades. Na altura em que comecei a programar, quase ninguém conhecia o Stack Overflow que é uma das comunidades mais usadas por programadores para busca de conhecimento e de resposta.
Uma das minhas maiores dores era encontrar informação. Tu aprendes os tópicos nos livros mas, à medida que vais aprendendo e usando o conhecimento, não te cinges só ao script que está lá e começas a andar à volta, a tentar novas coisas, a aprofundar o teu conhecimento nessa parte da matéria. Quando o livro não te dá as respostas que tu procuras a pergunta passa a ser: “A que comunidade é que eu posso ir?”.
Naquela altura eu não era muito tech savy para além daquilo a que eu efectivamente tinha acesso e os meus amigos não se interessavam muito por computadores. Onde eu residia a comunidade era muito ligada ao mar e dificilmente encontrava pessoas com outros interesses por isso eu andava um pouco mais isolado, ao contrário de muitas pessoas que eu conhecia que tinham influência de terceiros, às quais podiam pedir ajuda ou partilhar conhecimento.
Por isso é que sempre quis saber que comunidades existiam que me pudessem ajudar mas era muito difícil encontrá-las. O Google veio mais tarde e ainda não havia assim tanta informação online indexada. Era um blog post aqui. Um RSS feed ali. E andava assim a ver o que caía. Para além disso, não tinha internet em casa, o que não ajudava.
A partir do momento em que me encontrei nas redes sociais tudo mudou. Fiquei com uma lista interminável de gente indexada, que eu podia procurar por tópicos de interesse. Tornou-se muito mais fácil encontrar gente com interesse por programação, especificamente pelas linguagem que eu estivesse a estudar na altura. Digamos que a minha vida mudou um bocado quando descobri o IRC.
Aos poucos fui ganhando os contactos que mais tarde me ajudaram a criar estas comunidades. E, claro, tentei sempre estar activo para que as pessoas que venham a seguir tenham muito mais facilidade em criar estes laços do que nós tivemos na nossa altura. A partir daí, é com elas.
E falando de comunidades, és embaixador da Laravel Portugal e criador do seu podcast. Como tens visto a evolução dessa comunidade?
O podcast partiu não só de mim mas de um grupo de 5 ou 6 pessoas que dinamizam a comunidade de Laravel em Portugal e que começou num canal de Slack.
Hoje estamos no Discord mas começamos no Slack porque éramos muito poucos e toda a gente se conhecia. Como tínhamos muita discussão através de texto, pensamos que nos podíamos simplesmente juntar numa videoconferência e “conversar activamente”. Alguém complementou e disse: “se estamos numa videoconferência, porque não um livestream?” Na altura havia o “Hangouts on Air” onde era super fácil juntar o pessoal todo, carregar num botãozinho e “estar live”.
Começamos, e logo no primeiro episódio, funny story, estávamos ali descontraídos a falar com amigos e pessoas que conhecemos, à espera de zero visualizações e espectadores, quando de repente, vemos Taylor Otwell, o fundador do Laravel, a entrar no stream porque lhe tínhamos enviado um cold email de convite. Apareceu um bocado caído de paraquedas. O pessoal até pensou que era alguém a ser troll, mas era mesmo ele e até tivemos a oportunidade de falar com ele, trocar algumas ideia e colocar questões. Claro que, depois de ele entrar, entrou uma série de gente com ele. Isso gerou, naturalmente, muita tração.
A partir daí, e logo desde o primeiro episódio o Laravel Portugal tornou-se uma referência da comunidade Portuguesa. Primeiramente mais virado para o Laravel mas agora temos tido algum trabalho para ser um pouco mais abrangente. Uma comunidade Portuguesa, para gente apaixonada por programação. seja ou não de Laravel.
Falaram-me também de uma certa paixão tua por carros e por guiar. Como é que isso funciona?
Adoro conduzir… E adoro carros….
Agora estou a começar a ter uma ‘panca’ por motas. Obrigado, Carlos Martins.
Sempre tive uma atração por automobilismo. Quem é que não tira a carta e não pensar “agora vou conduzir até morrer?” Claro que 2 anos depois de tirares a carta só queres que te conduzam. Na comunidade onde eu vivo, quando alguns dos meus colegas faziam 19, 20, 21 anos, compravam um carro e, independentemente da marca ou calibre que fosse, e punham-se a ir para concentrações. Ver aqueles carros mais exóticos cativava-me muito e ‘carros’ é uma daquelas paixões que servem para desenjoar um pouco da programação!
Cheguei também a participar em algumas comunidades online, claro. Dependendo do modelo do carro que conduzia na altura, havia N comunidades para marcas específicas. Andava por lá também porque quando ia para as concentrações, conhecia gente que tinha vários carros o que fazia com que eu andasse de fórum em fórum para saber as novidades e manter essas ligações.
Como tudo o resto que gosto, é algo por que tenho curiosidade – até já investiguei sobre motores de combustão interna (!) – e estou familiarizado com a forma como os carros funcionam. Embora não saiba todos os ins and outs como no caso da programação, vou-me safando!
Por último, ocupas um cargo propício a remote working e que para além disso, gostas de “kitar” o teu home office. Como te deste com o isolamento durante a quarentena e como vês trabalho remoto no geral?
Tenho um escritório ao meu gosto, como costumo dizer.
Esta quarentena foi um oportunidade de levar este hobby ao extremo. A minha secretária de vez em quando parece um arco-íris. É só RGBs!
Quanto ao trabalho remoto, gosto muito quando tenho de me concentrar porque é um das formas que eu tenho de não me distrair. É fácil desligar todas as notificações, entrar em “airplane mode” e deixar de estar disponível. Ao mesmo tempo, sou uma pessoa que gosta de estar rodeada e sinto falta de contacto humano. A fórmula que eu estou a usar neste momento é 3 dias em casa, 2 dias no escritório, sendo esses 2, dias em que geralmente não preciso de muito concentração. Gestão, reuniões e pouco mais.
A falta de contacto humano foi um desafio durante a quarentena. Por muito que pudéssemos falar através de um canal de Discord o dia todo, continua a ser muito diferente de estar frente a frente com a pessoa. Faltou o ping pong também. Aqui não dá muito jeito estar a bater bolas contra o monitor.
Programação também ajuda o trabalho remoto. Há alguns processos que requerem sincronicidade como resolução de bugs, por exemplo, e quando estás longe, é difícil lidar com esses processos com a prontidão que queres. Tem que se convocar as pessoas. Não é só dizer “pessoal, temos um problema que veio de Customer Success e que temos que resolver agora”. Há mais atrasos, a validação demora mais tempo. Quando nos chega, é só a questão de coordenar a equipa para o resolver. Fora isso, é tudo muito fácil e tranquilo.
José Postiga é Senior Backend Developer e o convidado do Inside Infraspeak desta semana. Obrigado Postiga!